O crime, a lei e o objeto a (sobre o fantasma e o sacrifício) – Renato SARIEDINNE

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O crime, a lei e o objeto a (sobre o fantasma e o sacrifício) – Renato SARIEDINNE

VARIA

 

 « Onde há pena, há culto aos mortos, não há exceções »[1]

 

Em um capítulo de seu livro Punir, uma paixão contemporânea, Fassin[1], propõe uma discussão em torno de uma questão: « porque punimos ». Ele se concentra sobretudo em torno do sofrimento ligado à pena. Ele observa que na maioria das correntes da filosofia moral – pensamento que sustenta o direito penal – predomina a tese de que o castigo deve pressupor sofrimento. No entanto, observa Fassin, apesar de popular entre esses filósofos, os argumentos dos que defendem essa posição quase unânime é frágil, pois não há consenso entre as correntes quando tentam se justificar. Ele se pergunta sobre a origem do pensamento segundo o qual a punição pressuporia obrigatoriamente sofrimento, já que as pesquisas demonstram que essa associação não é socialmente produtiva. Ele cita dados estatísticos de diversos países que, analisados cuidadosamente, demonstram que o endurecimento penal não diminui as taxas de criminalidade.

 

Fassin não consegue responder à questão de maneira clara e extensa dizendo ter se deparado com uma dimensão « opaca » da punição na sua aliança com o sofrimento. Como cientista social, seus estudos indicam um ponto obscuro onde ele vê algo « difícil de nomear »[2], um enigmático « prazer ». Prazer ? Talvez, mas essa questão pode ser aprofundada. Pretendo neste texto ampliar a complexidade do tema, sobretudo à luz da psicanálise, tendo um doloroso caso brasileiro como objeto de análise.

 

Há dez anos, João Hélio, um menino de 6 anos morreu tragicamente durante um assalto. O fato foi amplamente divulgado pela imprensa e teve grande repercussão. Ministro da educação em 2015, Renato Janine assinou em fevereiro de 2007, o artigo Razão e sensibilidade[3] em um jornal de ampla circulação. Sua sinceridade lhe rendeu muitas críticas, essas últimas se devem menos à manifestação de seu desamparo do que do ódio que expressou pelos criminosos. Portanto, mesmo que involuntariamente, Janine se fez porta-voz de uma imensa massa igualmente tocada pela tragédia.

 

Aqui estão trechos de depoimentos e matérias jornalísticas datando da época, colhidos aleatoriamente na internet que descrevem as reações populares frente ao fato :

 

Leio jornal e choro todos os dias. Tenho duas filhas de 11 e 14 anos. Não consigo imaginar a profundidade da dor desses pais (…) internautas pedem leis mais duras contra os cinco criminosos acusados de envolvimento na morte da criança, arrastada por 14 ruas (…). Numa delas [comunidades Orkut] há mais de 37 mil integrantes. Estas comunidades pedem para que a população use camisas pretas numa manifestação de luto[4].

 Associação de Cartórios decreta luto oficial até sexta. Vendedores usam preto nas lojas em Ipanema[5].

 

Foram inúmeras manifestações nas ruas e mídias. Inclusive no estádio do Maracanã[6], na ocasião do jogo entre duas das maiores equipes da cidade do Rio. A televisão transmitiu o minuto de silêncio que fizeram jogadores e arbitragem, vários banners e cartazes, no campo e na torcida, onde se lia que a cidade estava de « luto » ; os panfletos também pediam « paz » e « justiça ».

 

Apesar de Janine não ter empregado a palavra angústia para descrever o que sentia na ocasião, não hesitamos em deduzi-la do « horror em estado puro » que relatou ter-lhe invadido. Ele disse ser « insuportável pensar no crime cometido contra o menino João Hélio », mas além disso, só conseguia pensar em « como devem ser punidos » os suspeitos capturados, mesmo antes do  julgamento.

 

Janine evoca a primeira imagem de sua angústia: o « sofrimento da criança », logo antes de se declarar crédulo e ver nessa imagem a fonte de ofensa do Outro : « Se há Deus, e acredito que haja (…), como admite Ele esse mal extremo, gratuito, crudelíssimo? » Frente ao mal causado a seu deus, Janine imagina o rito que acalmaria esse Outro ofendido. Em uma sequência de imagens, ele desenvolve de um rito para tratar da destruição de um objeto ressentido como tóxico e perigoso, status clássico da figura do criminoso, um resto no qual se atualiza desde sempre a fonte do mal-estar, articulada com a angústia e a culpabilidade.

 

Antes de prosseguir, manifestamos nossa profunda sensibilidade ao sofrimento testemunhado por Janine. Suas palavras de dor, mas principalmente de ódio o expõem a todo tipo de crítica, no entanto, elas também podem ser objeto de ‘escuta’. Apesar de feitas públicas, elaboro este texto considerando que são também palavras sinceras e logo íntimas, e por isso as considero com cuidado e respeito. Não discuto aqui a opinião expressa por Janine naquele momento, mas tento fazer um exercício que reconheço ser delicado, porque abordo publicamente a dor e o lado obscuro de uma figura pública, ainda viva e muito ativa. Suas palavras, no entanto, têm consequências e expressam no mínimo uma relação de profundo mal-estar com sua culpabilidade.

 

Diante dessa mistura de cenas pública e privada expressas em um texto que causou debate[7], proponho uma discussão sobre o crime, o ódio e a lei me servindo para tal de trabalhos de Freud e Lacan. Veremos como Freud – no contexto das massas e do sujeito – deduz o ódio da culpabilidade. Em seguida, como Lacan, por sua vez, encontra na angústia a fonte da culpabilidade. Em função do aspecto religioso atribuído por esses psicanalistas à dimensão religiosa do ódio inconsciente, seguimos a indicação dada por Lacan e recorremos também à antropologia de Marcel Mauss.

 


« O amor faz de nós criminosos sem remorso »[8]


Lacan[9] criticou a suposição freudiana de que todo fantasma seria uma variação do Édipo. Freud introduziu o tema do Édipo em sua Interpretação dos sonhos[10], no trecho dedicado aos sonhos de morte de pessoas amadas. Freud reeditou sua interpretação desse mito doze anos após essa primeira versão, com outra narrativa mítica, em Totem e tabu[11]. Curiosamente, Lacan[12]se referiu ao Édipo de Freud num momento famoso do seu seminário, como um sonho a ser analisado. Ele fazia referência à Lévi-Strauss[13] para indicar que os sonhos, como os mitos, se analisam em série.

 

Para Lacan, todo neurótico tem seu « mito individual », ou sua « constelação » familiar, que segundo ele, « presidiu o destino do sujeito em seu nascimento »[14]. Lacan se referia à posição dos pais do sujeito nas relações de trocas simbólicas, assim como suas condições de união. Essa singularidade do sujeito é entretanto análoga para cada cultura, instituição, família etc. Ora, Lacan efetivamente aproxima o mito de uma coletividade (o « epos ») do fantasma, considerando o primeiro uma versão coletiva do segundo. Cada subjetividade e cada coletividade apoiada de uma cadeia significante distinta, com seus dramas e narrativas que lhes são próprios.

 

Apesar de criticar a singularidade temática do fantasma proposto por Freud, Lacan homologou a universalidade da dívida subjetiva que coloca o sujeito em uma posição negativa frente ao Outro. Veremos que essa dívida destacada por Lacan em sua dimensão simbólica[15] se exerce também no real da angústia[16], e na imagem do corpo oferecida em sacrifício[17].

 

Freud desenvolve em Totem e tabu um mito do ódio, da culpa e do amor. Nele os filhos de uma suposta horda humana anterior à sociedade e à cultura matam o pai. Culpabilizados, eles recalcam o ódio pelo pai, o ódio não desaparece, mas reaparece como nostalgia, como se o pai não tivesse sido cruel, mas amável. Em consequência desse recalque, os filhos criam a religião para cultuar o pai e manifestar seu amor por ele. Na lógica freudiana, desse ódio originário se deduz igualmente a moral, as instituições, as leis e as punições para quem as desobedece. Entretanto, todo esse esforço não diminui a culpabilidade. O « bom » filho segue religiosamente as leis e atribui ao próximo, que não as segue, a culpa pelo que alimenta seu mal-estar. Assim, em Totem e tabu, a lei e as práticas penais, são realizadas em função da dívida com o pai, ou em nome dos ideais instituídos que encarnam essa figura.

 

Para Markos Zafiropoulos, a « revolução freudiana »[18] se expressa na complexidade desse amor, nascido do ódio e do arrependimento, quando os filhos « idealizam sua vítima »[19]. Zafiropoulos lembra a comparação feita por Freud do amor da massa ao amor mais corriqueiro e espontâneo, o da vida amorosa de um casal, que ele apelida de uma « massa de duas pessoas ». Essa clínica das massas, indica Zafiropoulos, é uma

 

Clínica do ideal, já que, para Freud, é em nome da idealização do pai morto que os filhos culpados se alienaram na lei, e é em nome desses ideais que os homens se organizam em instituições ou massas (…)[20].

 

O sujeito freudiano investe sua libido no objeto amado, com o qual também se identifica. Essa identificação, no entanto, pode tornar-se patológica, apesar de também ser liberadora, como lembra Zafiropoulos, uma vez que afasta o sujeito do narcisismo primário, igualmente patogênico. Porém, o amor, observa Freud, consome o eu do sujeito e lhe causa invariavelmente certo prejuízo.

 

Sobre essa última questão, Zafiropoulos retoma um ponto, especialmente esclarecedor, do texto freudiano de 1921 a respeito dos crimes de massa :

 

No amor, as funções atribuídas ao ideal do eu falham completamente: a crítica exercida por essa instância se cala, tudo o que faz e exige o objeto [amado] é simplesmente inquestionável. A consciência moral se isenta frente a tudo o que é favorável ao objeto; a cegueira do amor faz de nós criminosos sem remorso. (…) toda a situação se resume precisamente em uma fórmula: o objeto tomou o lugar do ideal do eu[21].

 


Culpa e ódio em Freud


 

Freud publicou sua hipótese mítica de Totem e tabu, apoiado em três referências desautorizadas pela comunidade científica, já na época de sua publicação[22], o que lhe rendeu uma reprovação imediata e unânime[23]. Essa obra é, no entanto, rica de uma refinada clínica do luto, tratando nos primeiros capítulos, sobretudo, da entrada do mundo dos mortos no mundo dos vivos.

 

Em Totem e tabu, Freud vê na angústia do luto uma natureza paranóica, já que frequentemente o sujeito sente-se perseguido pela alma do morto. É uma situação angustiante na medida em que no pensamento animista, tudo o que está ligado ao morto é associado à impureza (ao pecado), ao medo do seu contágio e ao perigo de morte que lhe é decorrente. No chamado pensamento animista, que Freud chega a dizer ser o próprio pensamento inconsciente, a proximidade com os mortos – física ou afetiva – é evitada a todo custo. Ele ainda homologa a expressão de Wundt segundo a qual os mortos « viram demônios »[24]. A principal função dos rituais fúnebres é de trazer paz aos vivos, eles são celebrados em nome dos mortos, festa que no pensamento animista, permite que a alma penada se afaste e que ela parta definitivamente para o além, para deixar os vivos em paz.

 

A ambivalência de sentimentos é um ponto fundamental da clínica freudiana do luto, onde as relações humanas mais profundas são sempre ambíguas e o amor puro inexistente, mesmo se o ódio é desconhecido, porque é recalcado. Para Freud, o sujeito do inconsciente é um ser moral que não suporta saber do seu ódio pelo morto, quando acredita sentir apenas amor. A morte da pessoa amada também traz um prazer insuportável.

 

O retorno dos mortos é hoje assunto comum, como foi no tempo da clínica de Freud. Já evocamos aqui a leitura lacaniana do Homem dos ratos, a história de um luto mal resolvido onde o muito angustiado Ernst Lanzer quase enlouqueceu. Seu mal-estar era deflagrado pelo retorno de seu pai, morto há anos, encarnado no significante rato. Lanzer denegria a figura de seu pai, um « rato de jogo » ou viciado, que perdeu nas cartas uma importante quantia que não lhe pertencia[25]. Outro exemplo da força dos mortos, dessa vez mais cruamente angustiante, é o famoso sonho do pai que adormeceu velando o corpo do seu bebê, e sonhou com seu bebê lhe puxando o braço para lhe avisar que seu corpo estava queimando, quando de fato queimava no quarto ao lado.

 

As palavras de uma antiga paciente reforçam a atualidade dessa figura inconsciente do pai freudiano. Viúva há mais de duas décadas, ela falou em nosso primeiro encontro dos sonhos que a angustiavam. Ela sonhava frequentemente com seu falecido marido. Ele começou a agredi-la fisicamente após a morte de um filho, mas mesmo assim, ela o amava. Esse homem, que cometeu suicídio lamentando a perda do filho, retornava em seus sonhos de viúva, deitado na cama conjugal, chamando-a para se juntar à ele para terem « uma vida sexual normal ». Ao acordar desses sonhos, contou, reza um Pai Nosso e uma Ave Maria esperando encontrar um pouco de paz.

 

Terminado seu relato, expressando certo desespero no rosto, ela olhou fixamente em meus olhos e perguntou, com um tom de voz alterado, se eu acreditava que Deus poderia perdoar um suicida. A ambivalência em relação à figura freudiana do pai inconsciente (que não é simplesmente a imagem do papai da família), ainda que complexa, é um operador clínico importante hoje, como no tempo de Freud. Tudo indica que o luto pelo qual se faz sintoma, ou outras formas de dívida simbólica com o pai, são fenômenos análogos, tanto para a psicologia das massas como para a análise do sujeito.

 

Diante a imagem de um menino morto, Janine expõe sua intimidade, mas vive também o paradoxo de ser o sujeito de uma massa freudiana que acompanha uma narrativa transmitida pelas mídias. Seguindo essa clínica freudiana das massas, vemos um sujeito substituindo sua crítica (seu ideal do eu) pelo objeto amado e perdido. O discurso midiático, permitia, ou até estimulava que se julgasse legítimo, no caso da morte desta criança, excessos dos mais terríveis, típico do « criminoso sem remorso ».

 

Abalado, Janine percebe a impotência de sua « razão » face aos sentimentos que determinavam seus pensamentos. Essa falta de crítica, a ingenuidade intelectual do homem sem « razão » não é a mesma do sujeito hipnotizado, que Freud compara ao apaixonado para descrever o sujeito das massas? « Mesma humilde submissão [ao pai, ao ideal, ou ao objeto], mesma docilidade, mesma ausência de crítica »[26]. A face obscura do sujeito emerge e o que foi curiosamente designado como « sensibilidade » domina a cena.

 

Apesar da sua angústia, Janine conseguia ainda confrontar seu ódio (que chamou de « sensibilidade ») a um esboço de « razão », virtude que, segundo suas palavras,

 

Segura muitas vezes as paixões desenfreadas. Quantas vezes, [pergunta Janine], não nos salvamos do desespero, do desamparo, do ódio e da agressividade, apenas porque a razão nos acalma, nos contém, nos projeta o futuro? Que crimes o amor desprezado não causaria, não fosse ele contido pela razão?

 

Beirando os limites do laço social, Janine justifica a inibição de sua razão, que para ele só « vale quando a dissonância (…) não é completa. Se o que sinto, continua ele, e o que digo discordam em demasia, será preciso aproximá-los ».

 

O sujeito freudiano das massas atualiza seus fantasmas infantis nos acontecimentos coletivos. Ele revive, por exemplo, temas sensíveis de seu « mito individual » na narrativa pública de uma tal tragédia. O testemunho da mãe sobre a morte de sua criança pode ilustrar a questão relativa ao delicado encontro de gerações.

 

No clímax da cena divulgada pela imprensa, e imaginada por milhões de sujeitos[27], a mãe conduzia o carro e João Hélio estava no banco traseiro. Ela

 

Havia avisado aos assaltantes que seu filho não havia conseguido se soltar do cinto de segurança. (…), a criança não conseguiu sair. (…) Com o menino preso pelo lado de fora do veículo, os assaltantes o arrastaram por sete quilômetros[28].

 

Tocado pela história que guia o ódio da massa, o sujeito pode ser exposto a uma configuração de culpabilidade desestabilizadora e angustiante. Como foi expresso publicamente, a coletividade entra em luto. Sua dívida com o Outro pode ser atualizada na culpa envolvida nesse crime, e aqui, a dor do outro também pode ser a sua. Mas qual tipo de dor, neste caso ? Freud dá alguns exemplos clínicos onde sujeitos

 

Tomados de questionamentos cruéis, se perguntam se não são responsáveis com sua negligência, ou sua imprudência, pela morte da pessoa amada. (…) nada é capaz de dar fim aos tormentos que representam um tipo de expressão patológica do luto (…). Sabemos que essas repreensões são, em certa medida, justificadas (…). Isso não quer dizer que a pessoa em luto seja realmente culpada da morte de um parente ou foi negligente, como pretende a repreensão compulsiva: isso significa simplesmente que a morte do parente satisfez um desejo inconsciente que, se tivesse a força necessária, teria provocado essa morte. É contra esse desejo inconsciente que a repreensão se exerce (…): é o caso clássico, o protótipo da ambivalência da afetividade humana.[29]

 

Essas palavras são de fato duras, mas descrevem uma situação comum, mesmo se os elementos não correspondem em detalhes iguais para todo sujeito, pois como vimos, apesar da dívida com o Outro ser universal, cada fantasma é « individual ».

 

É compreensível que Janine acredite que o alívio de seu mal-estar dependa de uma punição fantástica dos culpados e é mesmo possível que seu sofrimento se apazigue assim, com um tal sacrifício. Ele se junta à massa sedenta por vingança. Um exemplo dado por Mauss ajuda a esclarecer tal posição : o ritual fúnebre que encerra o luto é, em certas culturas, um sacrifício humano[30] e a leitura freudiana indica que a dívida simbólica (a culpabilidade) é atualizada na tragédia e paga com o rito, como o fazem os filhos no mito da horda primitiva.

 

É difícil prosseguir essa discussão à luz da psicanálise sem ao menos citar o estudo freudiano sobre o fantasma da criança batida[31]. A fórmula mais fundamental desse fantasma masoquista se reduz à cena onde o sujeito apanha do pai. Ele apanha, na concepção freudiana desse fantasma, por conta da culpa de uma fantasia incestuosa ou parricida, de um prazer proibido. Paradoxalmente, para Freud, nesse fantasma os tapas também são fonte de prazer, pois são interpretados como um sinal de amor, como uma metáfora incestuosa da penetração do pai[32].

 

O desejo dessa penetração imoral é recalcada e ao mesmo substituída pela agressão, que também é expiada, na maior parte das vezes, na imagem de uma outra criança que não o próprio sujeito que fala desse seu fantasma. Ainda sim, Freud observou que o sujeito pode reviver esse fantasma masoquista muito comum, não apenas a partir de lembranças, mas também na prática sexual, em leituras, e nós atualizamos, aqui neste artigo essa lista adicionando nela as narrativas televisivas.

 

É difícil saber até que ponto a dor transmitida pela história da morte de João Hélio também toma apoio nesse fantasma da criança batida. Talvez a dor do luto também se associe à esse fantasma, principalmente quando o martírio da criança, tendo uma mãe impotente como testemunha, é destacado e repetido pela televisão. Apesar das diferenças com a dor do luto, essas realidades psíquicas não são excludentes, o gozo do fantasma sado-masoquista da criança batida (um alter ego punido), se aproxima da vingança penal, na medida em que é um fantasma de purificação frente a um Outro ofendido por um crime.


O luto e as leis : Édipo na política


 

Segundo Freud, uma massa – como na comoção pública do caso João Hélio – se forma quando « um certo número de indivíduos que colocaram um único e mesmo objeto no lugar do ideal do eu (…) se identificam uns com os outros a partir de seu eu »[33]. Alimentado das mídias de massa, um número considerável de manifestantes associados exigiam publicamente vingança, e finalmente, a lei penal brasileira foi alterada[34]. Tentou-se ainda alterar a constituição para permitir a redução da maioridade penal[35]. As iniciativas[36] desse tipo tomadas pelo poder legislativo parecem portanto responder à mesma categoria da « sensibilidade » que tomou de Janine sua « razão ».

 

Impulsionado por um « turbilhão de sentimentos » Janine sugeriu um novo culto fúnebre/penal. Ele pensava em

 

Diferentes modos de impor a pena máxima. Se não defendo a pena de morte contra os assassinos é apenas porque acho que é pouco. Não paro de pensar que deveriam ter uma morte hedionda, como a que infligiram ao pobre menino. Imagino suplícios medievais, aqueles cuja arte consistia em prolongar ao máximo o sofrimento, em retardar a morte. (…) Torço para que, na cadeia, os assassinos recebam sua paga; torço para que a recebam de modo demorado e sofrido (…). Quando penso que, desses infanticidas, os próprios colegas de prisão se livrarão, confesso sentir um consolo.

 

Nesse fantasma, o apaziguamento de sua angústia depende de uma vingança de sangue. Janine atribuía à essas imagens um poder mágico, fazendo delas seu « consolo ». Resumidamente, esse culto, ou essa lei se apoia da produção de imagens de pessoas torturadas antes de serem assassinadas. Animado pelos meios de comunicação, Janine sugeria a « paga », ou a dádiva[37] a ser consagrada ao Outro.

 


Angústia, culpa e troca


 

Lacan (1966/1948) discutiu o aspecto imaginário da agressividade, citando cenas da degradação humana que segundo ele seriam « magicamente eficazes » : « castração, mutilação, desmembramento, torções, rompimentos, devoração e estouros do corpo »[38]. Ele ainda observou que tais cenas podem tomar a forma de « práticas sociais »[39], ou seja, elas podem ser instituídas e, por exemplo,  tomar a forma de lei e de práticas penais.

 

No mesmo texto Lacan cita ainda o Inferno do Jardim das delícias[40] (1503), tela de Jerônimo Bosch (1450-1516) repleta de criaturas demoníacas e atrocidades, algumas delas, sem dúvida assemelhadas àquelas que Janine descreveu em seu fantasma. Esses personagens se encontram diante de figuras religiosas doentias, de demônios atormentados com formas e inclinações animalescas e de animais com traços humanos. São mulheres e homens moribundos, sexualmente abusados, atormentados, aterrorizados, escravizados e alucinados.

 

Os personagens deste Inferno são julgados e massacrados, eles pagam por um sentimento de culpa, recebendo as mais cruéis punições desses seres assustadores. No processo, as figuras humanas encontram-se de mãos atadas para trás e amontoadas. Elas são violadas, torturadas, devoradas por cães e demônios. Essas imagens criadas há mais de 500 anos não são estranhas ao universo penal brasileiro[41], nem ao fantasma apresentado por Janine, ou ainda à qualquer cultura onde a prática penal é visivelmente inspirada de ódio e não de sua possível função de apaziguamento.

 

O tema dessa força misteriosa da imagem do corpo destruído, é aprofundada no seminário da Angústia[42], onde o desejo do Outro é descrito como um reflexo do desejo do sujeito do inconsciente. Lacan demonstra sua hipótese justamente pelo sacrifício, rito que consistiria para ele « em agir como se eles [os deuses] desejassem como nós »[43].

 

Segundo a observação de Hubert e Mauss, o sentido simbólico do sacrifício está vinculado ao seu caráter imaginário, com a destruição de um corpo que se supõe maculado e que representa antes da sua destruição « a última amarra do princípio divino ao mundo profano, de modo que seu rompimento traz a consagração definitiva e irrevogável »[44]. Trata-se nessa leitura, de uma operação simbólica que pretende dissolver o conflito interno de quem pede o sacrifício. Um conflito entre elementos antagonistas que supostamente se harmonizam quando o corpo impuro do « culpado » se separa de sua alma sagrada.

 

Os autores constataram que os espectadores do sacrifício se sentem purificados pois supõem que o movimento operado na vítima se repete nele, dissolvendo a tensão angustiante. Essas observações revelam o aspecto masoquista da prática penal no sujeito que frente ao seu mal-estar e sua própria culpabilidade, reage ao crime com ódio. Inconscientemente, o sujeito vê sua própria imagem no corpo destruído. No entanto, apesar do alívio momentâneo trazido pelo sacrifício, essa estratégia de combate ao mal-estar não suprime a culpabilidade do sujeito. Como a criança do fantasma da criança batida, o criminoso punido é um duplo daqueles que imputam nele a fonte do seu mal-estar. Quem sacrifica espera sair de uma posição negativa para um estado de graça frente ao Outro.

 

Lacan propõe uma alternativa ao mito do parricídio proposto por Freud para a origem da culpabilidade. Para Lacan, a origem da culpabilidade vem da angústia provocada pelo vazio no Outro. Aqui o sujeito perdido entre a angústia e a culpabilidade fantasia a cura de seu mal-estar supondo o objeto (do sacrifício) que falta ao Outro, e esse desejo não satisfeito pode se associar ao tema da culpabilidade. Lacan sugeriu ao auditor do seu seminário « trocar o sentido dessa falta [do Outro] lhe dando um conteúdo (…), isso explica o nascimento da culpabilidade e sua relação com a angústia »[45].

 

Essa discussão proposta por Lacan da relação do sacrifício com a angústia parece particularmente apropriada para o caso João Hélio, já que Janine propunha publicamente uma troca, de sangue por « consolo », ou um pouco de paz, diante de uma figura divina na qual ele disse acreditar.

 


A dívida e a dádiva


 

Lacan examina o tema das relações simbólicas de troca com o Outro e ilustra seu pensamento discutindo a dívida simbólica com dois elementos da cultura judaica. Segundo ele, o som do shofar indica ao sujeito a forma e o destino da incompletude do Outro, modelando o « lugar da angústia » e indicando « seu desfecho : a culpabilidade ou o perdão »[46].

 

O shofar é tocado no contexto do dia judaico do Grande perdão, o Yom kippur que, na antiga prática do ritual de purificação, o chefe religioso transmitia ao bode expiatório os pecados de seu povo antes de lhe sacrificar[47]. A circuncisão, também tem para Lacan um rito de natureza sacrificial, o que ele ilustra citando uma passagem do livro de Jeremias : « punirei todo circunciso em seu prepúcio »[48]. Para Lacan, na cultura judaica, o prepúcio é o objeto de uma operação simbólica, um pedaço de carne que se substitui à impureza do sujeito quando destruído. Um pedaço de corpo, um resto angustiante à ser consagrado ao Deus com sua destruição.

 

Lacan evoca em seu seminário a passagem bíblica onde Deus ataca Moisés porque ele se recusava a fazer a circuncisão de seu filho. Mauss comenta junto com Hubert a luta de Moisés com seu deus :

 

Caso levasse o rito até seu fim, ele [o sacrificador] encontraria a morte e não a vida. A vítima o substitui. Ela penetra solitária na perigosa esfera do sacrifício e morre, está lá para isso. O sacrificador permanece protegido : os deuses a tomam em seu lugar. Ela o redime. Moisés não havia feito a circuncisão de seu filho : Iahwe veio « lutar » com ele em uma pensão. Moisés estava a ponto de morrer quando sua mulher cortou violentamente o prepúcio da criança (…). A destruição do prepúcio satisfez ao deus que poupou Moisés. Não há sacrifício sem alguma referência à redenção[49].

 

Lacan recorre à figura estereotipada de Shylock, um agiota judeu, egoísta, amargo, malvado e vingativo; personagem de uma peça O mercador de Veneza de Shakespeare, polêmica por seu teor antissemita. Antônio, protagonista da obra, não pôde quitar a dívida assumida com Shylock que pretendia por isso tirar-lhe um pedaço de carne do seu coração. A troca no contexto da dívida com o Outro, disse Lacan, funciona segundo essa « lei da dívida e da dádiva »[50], onde a moeda, só « pode ser esse pedaço de carne »[51].

 

Essa lei religiosa da troca com o Sagrado, segundo Lacan, deve ser interpretada « pelo lado implacável da relação ao Deus [do antigo testamento], essa maldade divina que determina que é sempre com nossa carne que devemos pagar a dívida »[52]. Ele se refere à história de perseguição ao povo judeu, e a função de « resto »[53] que lhe foi dada pelo mito cristão, um objeto angustiante cuja mera existência remete à falta e insatisfação desse Ser inconsciente.

 

Freud vê na neurose um fenômeno de natureza religiosa, ou totêmica. Ele chega inclusive a abolir em Totem e tabu a distinção entre o chamado pensamento animista e o inconsciente. Para Freud essa dimensão religiosa deve ser considerada na análise, porque o analista se depara com sujeitos que « construíram proibições-tabu individuais, tabus tão rigorosamente obedecidos quanto os nativos o fazem em sua tribo ou sociedade »[54]. Seria ainda mais apropriado, dizia Freud, chamar a patologia do obsessivo (literalmente o « doente das obrigações » Zwangskrank), de « Tabukrankheit »[55], doença do tabu.

 

Para Freud, no fundamento das sociedades, a cultura, a lei e a religião não se distinguem[56]. Sob esse ponto de vista, as práticas penais aparecem como um gênero teatral associado ao sacrifício penal[57]. Nessa apresentação se encena o amor ao pai e o ódio para aquele que ofende sua lei. Para o sujeito das massas, esse « espetáculo » toma uma forma trágica[58] e tornar-se uma questão de vida ou de morte, daí o jogo de linguagem que Freud faz com a palavra alemã Schauspiel[59].

 

Concluo esse texto observando que o sujeito « sem razão » está submetido à força do inconsciente, mas em sua dimensão religiosa. A religiosidade, nesse caso, não está ligada a uma instituição precisa, mas à relação do sujeito ao real, mesmo que ele seja ateu : « Os deuses [para quem recorre ao sacrifício] são um elemento do real e sua existência não depende da nossa vontade, mesmo se não temos nenhuma relação com eles »[60]. Mesmo sendo ateus, ressalta Lacan o religioso existe em nós e ignorar sua presença e sua complexidade apenas abre os caminhos para sua força mórbida.

 

Como Fassin indicou, essa relação pode ultrapassar os limites da lei e automaticamente o interesse coletivo da sociedade. As reações desmedidas de ódio, que se pretendem justificadas em nome de algum ideal podem ser criminosas. Por um lado esse excesso deve ser observado pelas instituições e as leis devem ser consideradas, pois a angústia não exime do sujeito a responsabilidade sobre seus atos. Por outro lado, ao contrário do que decorreu do caso João Hélio e de outros, a lei não pode ser deduzida da angústia, por vários motivos. Sobretudo, porque a função do Estado e de seus representantes não é a de se submeter servilmente a esse Outro terrível. As instituições do Estado, mesmo embasadas por suas leis, também podem « perder a razão » e operar no crime. Os representantes dessas instituições, devem sobretudo ser capaz de se posicionar e velar pelo laço social.

 

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[1]                     D. FASSIN, Punir une passion contemporaine, Paris, Seuil, 2017.

[2]                     Ibid., p. 114.

[3]                     R JANINE, « Razão e sensibilidade », Folha de São Paulo, 2007. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u68751.shtml consultado no 03/10/2016.

[4]                     Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Rio/0,,MUL5590-5606,00-NAS+RUAS+DO+RIO+PESSOAS+VESTEM+PRETO+POR+JOAO+HELIO.html acessado no 03/05/2016.

[5]                      Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Rio/0,,MUL5746-5606,00-CARTORIOS+PRESTAM+HOMENAGEM+A+JOAO+HELIO.html  acessado no 03/05/2016.

[6]                     Disponível em  https://www.youtube.com/watch?v=aNvAHmxfrxc acessado no 03/05/2016.

[7]                     Dentre as reações de pessoas públicas, destacamos um pequeno comentário de tom compreensivelmente crítico feito por Maria Rita Kehl (2007), a respeito da posição tomada por Janine em seu artigo: “É lamentável que um homem público suponha que seus afetos, fantasias e ruminações possam contribuir para o debate sobre o rumo justo que os brasileiros desejam dar à grave crise de violência social que nos atinge. Fantasias sádicas e desejos onipotentes de vingança são infantis, banais, humanos. Ocorrem a qualquer um, movidos pela mais santa ira.” (Cartas publicadas no Painel do Leitor, 04/03/2007)  http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u68949.shtml).

[8]                       S. FREUD, « Psychologie des masses et analyse du moi », Œuvres complètes, vol. XVI, Paris, Puf, 1991, p. 51.

[9]                     J. LACAN, « Le mythe individuel du névrosé », Ornicar ?, n°17/18, 1979.

[10]                  S. FREUD, L’Interprétation des rêves, Paris, Puf, 1967.

[11]                  S. FREUD, Totem et tabu, Paris, Payot, 1988,

[12]                  J. LACAN, Le Séminaire, livre XVII, L’envers de la psychanalyse, Paris, Seuil, 1991.

[13]                  Lacan se refere ao capítulo “La structure des mythes” in Athropologie structurale, Paris, Plon, 1958.

[14]                  J. LACAN, « Le Mythe individuel du névrosé », op. cit., p. 295.

[15]                  Ibid.

[16]                  J. LACAN, Le séminaire, livre X. L’Angoisse, Paris, Seuil, 2004.

[17]                  J. LACAN, « L’agressivité en psychanalyse », Écrits, Paris, Seuil, 1966.

[18]                  M. ZAFIROPOULOS, Du père mort au déclin du père de famille. Où va la psychanalyse, Paris, Puf, 2014, p. 20.

[19]                  Ibid.

[20]                  Ibid..

[21]                  Freud citado por  M. Zafiropoulos, Ibid, p. 24.

[22]                  O mito darwiniano da horda e do primata macho dominante na origem da organização social humana; a suposta confirmação científica desse mito pretendida por  Atkinson, relatando uma horda análoga a dos macacos, em cavalos e em bovinos; mas foi em Smith que Freud encontrou sua maior inspiração para sua própria teoria totêmica do sacrifício. Em outras palavras, o legado de Totem e tabu seria beneficiado com uma discussão crítica sobre a teoria do sacrifício em Freud.

[23]                  A. L. KROEBER, “Totem and tabou : An ethnologic psychoanalysis”, American Anthropologist, New Series, vol. 22, 1920. Esse é um exemplo que ilustra o padrão das críticas feitas a Totem e tabu pelos antropólogos mais importantes da época. As críticas voltavam sempre ao problema da escolha dos autores assim como ao método freudiano.

[24]                  Wundt citado por S. Freud, Totem et tabou, op. cit., p. 71.

[25]                  A manifestação do ódio do homem dos ratos pelo seu pai, foi entretanto observada por Freud pela transferência agressiva de seu paciente : S. FREUD, « Remarques sur un cas de névrose obsessionnelle ou L’homme aux rats »,  Cinq psychanalyses, Paris, Puf, 1954.

[26]                  Freud citado por Zafiropoulos, op. cit., p. 24.

[27]                  Escolhemos o artigo Wikipédia porque aqui não importa o rigor da fonte escolhida, já que o essencial é a função difusora da fonte; a força do mito e do fantasma não depende da verdade factual.

[28]                  Disponível em  https://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_João_Hélio#O_crime consultado no 19/07/2016.

[29]                  S. FREUD, Totem et tabu, op. cit., p.73-74.

[30]                  M MAUSS, op. cit. Também ver : H. HUBERT, M. MAUSS, Essai sur la nature et la fonction du sacrifice. Disponível em http://classiques.uqac.ca/classiques/mauss_marcel/melanges_hist_religions/t2_sacrifice/sacrifice.html consultado em 19/07/2016.

[31]                  S. FREUD, « Un enfant est battu », Névrose, psychose et perversion, Paris, Puf, 1997.

[32]                  Esse é um detalhe do conjunto mítico da obra freudiana que se alinha à ambivalência articulada em Totem e tabu.

[33]                  M. ZAFIROPOULOS, op. cit., p. 24.

[34]                  Segundo Aline Seabra Toschi (2007), a lei nº 11.464/07 que atrasa a progressão de pena no caso de crimes hediondos foi criada em resposta à repercussão do caso João Hélio.

[35]                  Segundo Campos « dois crimes de grande repercussão pública (os assassinatos do casal Liana Friedenbach e Felipe Caffé, em 2003, e o de João Hélio, em 2007) – mobilizaram a apresentação e tramitação das Propostas de Emenda à Constituição (PEC’s) favoráveis à redução da maioridade penal na Câmara dos Deputados ». M. CAMPOS DA SILVEIRA, « Mídia e Política : a construção da agenda nas propostas de redução da maioridade penal na Câmara dos Deputados » Opin. Publica, Campinas, vol. 15, n°2, 2009, p. 478. Disponível em   http://dx.doi.org/10.1590/S0104-62762009000200008 consultado no 11/04/ 2016.

[36]                  Não houve, no entanto, qualquer discussão a respeito da qualidade da prática penal atual. Seria interessante verificar se esse tipo de medida inibe efetivamente a prática de crimes hediondos, ou se são apenas medidas populistas e inférteis.

[37]                  Sobre esse tema, ver três artigos de Marcel Mauss. M. MAUSS, « Essai sur le don », Sociologie et anthropologie, Paris, Puf, 1950. ;  M. MAUSS, « La religion et les origines du droit pénal d’après un livre récent », op. cit. ; H. Hubert, M. MAUSS, « Essai sur la nature et la fonction du sacrifice », op. cit. Estes são três trabalhos essenciais de Mauss para discussão da relação da  prática penal como rito fúnebre.

[38]                  J. LACAN, « L’agressivité en psychanalyse », Écrits, Paris, Seuil, 1966, p. 104.

[39]                  Ibid.

[40]                  A obra pode ser visualizada detalhadamente aqui : https://tuinderlusten-jheronimusbosch.ntr.nl/en

[41]                  A respeito, procurar os documentos publicados pela Anistia Internacional sobre os crimes cometidos por instituições de segurança de Estado brasileiro, ou estrangeiro, como este sobre a atuação da polícia do Rio de Janeiro, por exemplo : https://anistia.org.br/wp-content/uploads/2014/08/Br-Vim-buscar-sua-alma.pdf.

[42]                  J. LACAN, Le séminaire, livre X. L’Angoisse, op. cit.

[43]                  Ibid., p. 321.

[44]                  H. HUBERT, M. MAUSS, op. cit., p. 31.

[45]                  J. LACAN, op. cit., p. 320.

[46]                  Ibid.

[47]                  O Yom kippur é mencionado no Levítico, livro que também trata das questões da impureza e do perdão através do sacrifício. Esse ritual é precedido do momento do julgamento divino, onde o shofar também é utilizado. A prática do sacrifício de animais de grande porte foi abolida, mas mantém-se viva de maneira aproximada por grupos ortodoxos.

[48]                  J. LACAN, op. cit., p. 247.

[49]                  H. HUBERT, M. MAUSS, op. cit., p. 76. Uma curiosidade dessa passagem das mais lembradas sobre a história de Moisés é que uma criança também é agredida frente ao Outro, pelo seu amor.

[50]                  Termo de Marcel Mauss empregado por Lacan in op. cit., p. 254.

[51]                  Ibid.

[52]                  Ibid., p. 255.

[53]                  Ibid.

[54]                  S. FREUD, Totem und Tabou, Frankfurt am Main, Fischer, 1991, p. 74.

[55]                  Ibid.

[56]                  Freud passa pela questão nos primeiros capítulos de Totem e tabu, op. cit., e T. REIK, Le besoin d’avouer, Paris, Payot & Rivages, 1997, onde ele discute longamente o assunto.

[57]                   S. FREUD, « Personagens psicopáticos no palco », Obras completas. Rio de Janeiro, Imago, vol. VII, 1977.

[58]                  A palavra « tragédia » faz alusão ao sacrifício, já que sua etimologia designa o « canto do bode » (expiatório). Em seu artigo Théâtre occidental – Histoire, Robert Pignarre indica que o teatro em suas origens « Se constituiu como uma arte após se emancipar das liturgias religiosas de onde ele veio, dessa espécie de culto a Dionísio que, como outros cultos agrários primitivos, praticava em tempos remotos um ritual mágico repleto de sacrifícios humanos e de canibalismo », in Encyclopædia Universalis. Consultado em http://www.universalis-edu.com/encyclopedie/theatre-occidental-histoire/  consultado no 20/07/2012.

[59]                  A palavra Schauspiel, ou peça de teatro em alemão, é utilizada por Freud nesse texto para indicar a participação ativa de quem assiste à cena ; os radicais Schau (olhar do espectador) e Spiel (atuação na peça de teatro) supõe que para se completar, precisa da participação ativa do ator, assim como do espectador.

[60]                  J. LACAN, op. cit., p. 355-356.

[1]                     M. Mauss, La religion et les origines du droit pénal d’après un livre récent, p. 9-10. Disponível em http://classiques.uqac.ca/classiques/mauss_marcel/oeuvres_2/oeuvres_2_15/religion_droit_penal.pdf consultado no 19/07/2016.